domingo, 3 de abril de 2011

"QUATRO DÉCADAS DE ABANDONO"

MELHORIAS NAS ESTRADAS PARA O LITORAL E A FORÇA DO TRANSPORTE FERROVIÁRIO CAUSARAM A APOSENTADORIA DO BARCO EM 1956



O Vapor Blumenau não resistiu ao Progresso e afundou com o abandono. Com a chegada da estrada de ferro, na década de 50, e com melhores estradas ligando Blumenau a Itajaí, o movimento no porto de Blumenau caiu gradativamente até que, em 1956, o Vapor foi aposentado. A partir daí, seguiu-se uma trajetória de mudanças e deterioração, até a restauração definitiva.
Tão requisitado no final do século 19 e nas primeiras décadas do século 20, o Vapor Blumenau foi sendo substituído aos poucos. Primeiro, com a melhora das estradas, que agilizavam qualquer viagem de passeio até Itajaí ou Desterro (atual Florianópilis). Depois, em 1954, com a inauguração das linhas da estrada de ferro até Itajaí, pela rapidez e capacidade de cargas dos trens. Como registro das últimas viagens do barco, a escritora Edith Kormann afirma que Alfredo da Luz atuou de 1929 a 1956 como marinheiro no Blumenau e de outros barcos do gênero.
Desativado e abandonado, o vapor ficou atracado em Itoupava Seca, junto ao trapiche da Estrada de Ferro de Santa Catarina (EFSC) e, em 1957, encalhado no Ribeirão do Tigre. Em 1959, Pedro Nogueira da Luz, filho do último comandante do Vapor, Alfredo da Luz, começou a campanha denominada SOS para o Vapor Blumenau. Blumenauense, na época radicado em Curitiba, Pedro enviou cartas para diferentes localidades locais, estaduais e federais, pedindo que o barco fosse doado pela EFSC para a municipalidade e que recebesse os cuidados devidos a um patrimônio histórico.

DOAÇÃO

No início de 1960 o processo de doação foi formalizado, atendendo a solicitação da Câmara de Vereadores de Blumenau, feita no ano anterior. A prefeitura e o Kennel Clube de Blumenau começaram então uma campanha para instalar o barco em local público central. Com uma cheia do Itajaí-Açu no dia 8 de setembro de 1961, Raul Deeke capitaneou o transporte do vapor, semisubmerso na Itoupava Seca, até as pilastras de concreto na Prainha, pela emersão de tambores de ar que fizeram o vapor flutuar.
No mesmo ano a prefeitura deu comodato do Vapor ao Kennel Clube. Segundo o memorialista Niels Deeke, a entidade, em 1961, consertou e pintou o barco, além de viabilizar as pilastras de apoio do Vapor. "Naquele ano, o barco passou por um grande processo de restauração, que não contou com apoio técnico, mas melhorou sua imagem", afirma a arquiteta Rosália Wal.
A prefeitura reassumiu a manutenção do barco depois que o Kennel não instalou sua sede no Vapor. Segundo Sueli Petry, no início da década de 60 até a restauração atual, o barco passou apenas por uma reforma documentada, no governo de Dalto dos Reis, em 1985. Sem a conservação adequada, o barco foi sendo destruído pela ação do tempo e depredações.

"RECORDAÇÕES"



Margareta Medeiros - 84 anos, blumenauense filha de Alfredo Baumgarten, que nas décadas de 20 e 30 do século 20, preferia o trajeto até o Litoral com o Vapor Blumenau:
"Quando criança eu devo ter andado no Vapor, mas o que mais me recordo é de quando era adolescente, com uns 13 ou 14 anos. Naquela época, os blumenauenses descobriram a Praia de Cabeçudas, em Itajaí, que parecia um bairro de Blumenau. As famílias que aqui eram amigas se transferiam para lá no verão. A gente deixava os pais irem de carro e íamos com o naviozinho, porque era muito mais divertido. Lembro que a gente embarcava as 10 horas, perto da atual prefeitura. Levava lanche e uma vitrola, para um grupo de amigas. Na época tinha uma salinha, com muitas janelas, com mesas e duas poltronas de vime. Lá, a gente fazia o lanche, com frutas pães e sanduiches. Lembro que chegavámos na barra do rio, em Itajaí, as 17 horas. Os pais já estavam lá a tempo, porque um automóvel na época levava de duas a três horas para chegar em Itajaí. Sempre me lembro que a gente via no Vapor o carro dele nos esperando. Uma coisa muito interessante deste navio é que quem quisesse viajar, bastava ficar na barranca do rio, com a malinha do lado, e abanar com um lenço. Daí o navio encostava e a pessoa subia por uma tábua. Lembro também da cozinha do navio, onde faziam feijão, arroz, fritavam um peixinho... O tempo das viagens variava conforme a maré. Quando subia, era mais vagaroso, o Blumenau não balançava, apenas um pouco, quando passava alguma lancha. Na parte de trás do navio, depois da salinha com janelas, o barco era aberto. A gente ficava lá sentada, onde tinha a melhor visão do rio".



Pedro Nogueira da Luz, 72 anos, filho do último comandante do barco, liderou, em 1959, a Campanha SOS para o Vapor Blumenau:"
"Em 1959, eu morava em Curitiba e, numa passagem pro Blumenau, viu Vapor se deteriorando. Em seguida, tive o conhecimento que a rede ferroviária venderia o barco como sucata. Pelas rádios, prometi ao povo que faria uma campanha para que o vapor fosse doado para a Prefeitura. De volta a Curitiba, mandei dezenas de cartas para imprensa, para o prefeito, deputados federais, diretor de rede ferroviária, até para o Presidente da República. Um mês depois, recebi um telex da Casa Civil dizendo que o Vapor seria doado. Depois, continuei insistindo para ele ser recuperado. Hoje, felizmente, ele está lindo em sua forma original. É um sonho realizado, porque o Vapor é como se fosse um filho adotivo. Quando eu era garoto, navegava muito nele. Meu pai era marinheiro e depois foi comandante. Fazíamos muitas viagens até Itajaí, onde meu avô morava. O barco trouxe evolução para a cidade, em todas as áreas. A molecada fazia a festa nas viagens. Muitas vezes, eu subia no comando e ajudava meu pai a guiar".

- Matéria publicada em 31/08 e 01/09 de 2002, no Jornal de Santa Catarina.

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